O Homem que Vive a Abençoar
Bênção, painho!
Nossas conversas sempre são
encerradas com uma bênção. Assim é comigo, mas também é com os demais
filhos/as, netos/as, com vizinhos/as, amigos/as e com todas as pessoas que
cruzam seu caminho.
Quando estamos juntos, a bênção para
dormir e a bênção ao acordar, não pode faltar. À distância, pelo telefone, sua bênção
é enviada sempre que nos falamos. Nestes tempos de pandemia, em que estamos
conversando quase todos os dias e às vezes até mais de uma vez por dia, a
bênção se repete a cada diálogo. Não precisa pedir. Ele o faz como algo natural
de seu modo de ser.
As bênçãos partem espontaneamente
parecendo brotar direto do coração. Tem algumas dessas bênçãos que se repetem desde
que me dei conta de sua existência em minha vida como meu pai: Deus te proteja;
Deus te crie para o bem; Deus te faça feliz; Deus te livre de todos os males;
Deus seja a administração de sua vida; Deus oriente os teus caminhos, etc. Agora,
em tempos de pandemia, tem acrescentado: Deus te livre do corona vírus e também livre
todas as pessoas que convivem com você. Fico pensando na força destas bênçãos e
seu efeito em minha/nossas vidas, mas, penso sobretudo, no ato de abençoar. No
fundo, ele não apenas abençoa, mas revela a bênção que ele é e que cada pessoa abençoada
é para ele.
Abençoar é uma experiência mística.
Na trajetória de libertação do povo hebreu, libertos da escravidão no Egito,
Moisés aprendeu e recebeu a tarefa de ensinar sobre como abençoar: “O Senhor te
abençoe e te guarde. O Senhor mostre a sua face e conceda-te a sua graça. O
Senhor volva o seu rosto para ti e te dê a paz!” (Nm. 6, 24-27).
Sou de um lugar (Região do Sisal
no Sertão da Bahia), de uma cultura e de uma geração em que abençoar faz parte
dos princípios éticos de convivências entre as pessoas. Talvez hoje, com as
tecnologias, isso tenha se perdido um pouco. Mas, abençoar, cooperar uns com os
outros, são preceitos espontâneos da vida cotidiana. Desde as distintas
parteiras que sempre estavam de plantão para ajudar as crianças nascerem de
parto natural aos raizeiros (meu pai era um deles) que preparavam os remédios
naturais oriundos do acúmulo da sabedoria popular passada de geração para
geração e que curavam as pessoas de tantos males. Não se pode deixar de falar
das benzedeiras, como minha comadre “Maria de Beu” e tantas outras, que,
enquanto sentávamos na cadeirinha no terreiro, nos cobriam de bênçãos com
diversos ramos verdes de alecrim, mastruz, cidreira, folhas da laranjeira e
tantas outras mais. Isso tudo diz de um modo de viver a vida, cuja linha que
circula tudo e todas as relações é a solidariedade e o ato de abençoar. Uma
forma concreta de sociedade do bem-viver.
Voltando para o homem que vive a
abençoar, hoje é o dia dele. Meu painho Miguel. Neste 8 de maio de 2020 ele completa
87 anos. Vida totalmente colocada à serviço das pessoas. Vive a abençoar. No
fundo, a bênção é ele mesmo! Ele apenas a revela em cada bênção que dá. Ele é
um mensageiro dos valores mais sublimes da vida. Ensina, com seus gestos, que a
felicidade é fruto das coisas simples da vida. Basta viver com o essencial. Não
aceitar as injustiças. Escutar as pessoas e a natureza. Sentir a chuva, o sol,
a brisa. Acolher a natureza e as pessoas como irmãos. Ser grato. Ele é um
mensageiro. Segue ensinando o valor da bênção e revelando-se bênção em nossas
vidas e de tantos/as amigos/as que tem.
Parabéns, painho Miguel!
Hoje sou eu, somos nós que
queremos lhe abençoar: Deus lhe faça sempre feliz! Amamos você!
Belo Horizonte, 08 de maio de 2020
Maria do Rosário de Oliveira Carneiro
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